17 de jan. de 2012

Unidade 9

Fórum 14:
O texto “Passagens da Fotografia” propõe uma reflexão sobre o fazer fotográfico atual, tomando como ponto de partida uma de suas questões fundadoras, que sempre permeou os debates e ainda estimula a produção e o pensamento fotográficos. Essa questão diz respeito à própria definição da fotografia: o que a caracteriza enquanto prática e linguagem no contexto das artes visuais e dos demais saberes humanos?

Segundo nos explica Antonio Fatorelli, as possibilidades de resposta a essa questão, inaugurada no século XIX, já se deram marcadas por duas tendências. Uma purista, que tenderia a defender a autonomia da fotografia com relação a outras práticas e a definiria como reflexo da realidade através dos procedimentos próprios ao meio. Outra pluralista, que trataria de assimilar uma prática aberta às influências da pintura e de outras formas de expressão e teria introduzido um maior grau de experimentação técnico-formal e questionamento de seu índice de realidade.

A partir do delineamento dessas duas tendências, uma série de análises comparativas entre importantes fotógrafos nos orienta pelo desenvolvimento da fotografia até a produção mais atual. Com Emerson e Robinson, vimos como esse debate envolveu diferentes noções de veracidade e artifício no âmbito de uma busca comum por realismo; com Stieglitz e Man Ray, a recusa e a adesão à hibridização constituíram direções divergentes dentro de um mesmo interesse pela lógica subjacente das imagens; e com Meyerowitz e Fleischer, a virtualização contemporânea se apresenta em distintas ênfases, por um lado como um novo “sublime natural”, por outro lado como a radical dessubstancialização da fotografia.

Hoje, as redes e os recursos eletrônicos são meios de produção estética e de múltiplas experiências espaço-temporais, e a desmaterialização de processos e produtos transforma continuamente a nossa relação com os objetos e as imagens. Nesse contexto, como fica a antiga questão sobre o índice de realidade da imagem fotográfica? Parte significativa do fazer fotográfico recente tem evidenciado que as experiências que fazemos do real estão sempre, em alguma medida, misturadas ao aparente, ideal, ilusório ou suposto, isto é, são inseparáveis de uma dimensão virtual. E a recíproca também é verdadeira: experimentamos o virtual sempre em diálogo com o que conhecemos como real – lembre-se, por exemplo, do que acontece em sonhos, na imaginação ou em simulações eletrônicas.

Essa é uma lição que podemos extrair da obra dos contemporâneos Meyerowitz e Fleischer, já que o primeiro mostra um real filtrado pelo virtual, enquanto o segundo trabalha um virtual colado ao real. Poderíamos afirmar coisas semelhantes sobre as obras de Cindy Sherman e Laurie Simmons. Procure conhecer mais a respeito das produções desses quatro fotógrafos acessando-as na Internet ou em qualquer fonte à sua disposição.

Reflita: como essas obras lidam com a tensão entre “natureza” e “artifício”?

Aproveite para fazer a si mesmo esta pergunta: como o seu próprio trabalho articula as dimensões do real e do virtual, que inseparavelmente constituem as imagens?

O desenvolvimento do “virtual tecnológico” tem colaborado para uma crescente virtualização da fotografia, mas o interesse dos fotógrafos no vínculo real/virtual é anterior à expansão dos circuitos eletrônicos, pois surgiu junto com os primeiros recursos fotográficos, como vimos com Robinson. Outro fotógrafo que prefigurou as experimentações e a plena virtualização do momento atual foi Man Ray. Faça uma pesquisa mais ampla de imagens e textos sobre a obra desse artista que, além de fotógrafo, foi cineasta e pintor – e lembre-se dos dois trechos de seu filme “O retorno à razão” incluídos no CD-ROM. Observe a sua variada produção, sempre envolvida nas possibilidades da arte como meio de acesso ao inconsciente.

Fatorelli menciona três aspectos que seriam característicos das imagens na contemporaneidade: o descentramento, a desconexão com o aqui/agora e o trânsito entre diferentes suportes. Como poderíamos relacionar esses aspectos à obra de Man Ray?

Nesse fórum debata com seus colegas alguns significados e exemplos desses três aspectos na produção de Man Ray


Resposta:

   Man Ray enfocava diversos temas com igual senso de legitimidade e coerência estilística. Sua contribuição para a fotografia de moda fora singular, além de denotar grande poder de contemporaneidade (até hoje presente). Trabalhou nesse métier com a mesma conceituação que tinha sobre a arte:
   Alguns dos mais completos e satisfatórios trabalhos de arte têm sido produzidos quando seus autores não têm idéia de criação de uma obra de arte, porém se preocupam com a expressão de uma idéia. Pela ordem natural das coisas, não se criam obras de arte. Isto se estabelece em nós, é a faculdade de interpretação peculiar da mente humana que vê a arte.
   Apesar de intrinsecamente comercial, a fotografia de moda feita por Man Ray tinha especificidades indeléveis e duas palavras seguidas como dogmas: liberdade e prazer. O fazer artístico permanecia imbuído de convicções indefectíveis. Segundo dizia, “Tudo é arte”. Então, por que não expor arte genuína nas páginas de uma revista de moda?”
   Em 1922, conhece o estilista Paul Poiret e começa a tirar fotos para ele. Na verdade, Poiret acreditou no feeling de Man Ray para revolucionar a fotografia de moda. Poiret, grande ditador da moda em Paris, viu-se, de repente, deposto pelo talento irreverente de Chanel. Na guerra para reaver seu posto, resolveu reagir e, por isso, contratou Man Ray. Este, por sua vez, exigiu carta branca para trabalhar. A arte, a partir daí, regeu os termos da elegância, dando um toque de desejo e atitude. O ponto crucial na trajetória de Man Ray no contexto fashion foram suas intervenções cênicas, a direção de modelos e a utilização de técnicas distintas das convencionais. A roupa, a beleza feminina eram dispostas como peças para a interpretação alucinada, e algumas vezes dúbia, do espírito desconstrutivista, definidora de sua expressão. Não somente documentava roupas, mas as elevava ao patamar de obra de arte.
   É certo que, no início, o fotógrafo fez uso da fórmula certa da imagem da moda — linha, cor, textura e, acima de tudo, sex appeal. Entretanto, a vontade hegemônica de instaurar a originalidade prevaleceu. De acordo com Merry Foresta e Willis Hartshorn, curadores da exposição Man Ray/Bazaar Years: A Fashion Retrospective, realizada em 1990, “a textura e linha foram suprimidas pelos vestidos de couturier e as esculturas do artista, porém a junção de arte, feminilidade e moda era a idéia de Man Ray”. A participação dele na moda é extremamente importante, principalmente na questão de abstrair a figura feminina como objeto e, assim, firmá-la como agente.



 
Questão Individual 8:
 
O que temos tomado como conceitos para a análise das obras incluídas no CD-ROM, desde o começo do curso, são palavras que sintetizam idéias, sensações ou práticas percebidas em diversas atividades de criação visual, sobretudo no período que estudamos aqui. Esses conceitos são relativos, como temos visto, pois seus sentidos e aplicações não são definitivos, nem as suas relações com as obras são fixas. O que interessa na definição e no uso desses conceitos, tanto no processo de criação visual quanto na reflexão sobre um trabalho, é que eles nos ajudem a problematizar, a configurar e a aprofundar as atividades em que estamos envolvidos. Trabalhe mais as relações entre conceito e obras, tomando como ponto de partida o conceito de “estranhamento”, empregado no texto de Antonio Fatorelli. Volte ao texto, reflita sobre o sentido dessa palavra no texto e sobre as suas possíveis aplicações. Em seguida, vá ao CD-ROM e, utilizando a ferramenta Espaço de Pesquisa, selecione um grupo de cinco a oito obras que, na sua opinião, possam ser pensadas a partir desse conceito de “estranhamento”. Elabore um texto, com no máximo uma lauda de extensão, sobre as obras que você selecionou, explicando como percebe as relações de cada uma com o conceito, e envie o texto ao tutor.


Texto:
   O que faz um artista se destacar dentre uma multidão que produz arte é a sua capacidade de apresentar ao mundo algo extraordinário. Seja pelo talento, seja pela perspicácia de produzir algo arrebatador intelectualmente, seja pela capacidade de gerar ironia ou despertar reflexões.
   Muitos artistas se destacam pela criatividade de elaborar novas técnicas de produção. Na fotografia, por exemplo, a arte de retratar o real pode dar espaço para a criação de obras que causem estranhamento. Para tal, desde os primórdios da fotografia, o conhecimento físico-químico também se torna uma arma poderosa para possibilitar as experimentações e a obtenção de uma obra diferente e original.
   Etienne-Jules Marey desenvolveu a técnica conhecida como cronofotografia, para obter uma imagem que registre o movimento, disparando diversas vezes, em intervalos de segundos, sem girar o negativo. Desta forma, o resultado era uma seqüência de fragmentos de um deslocamento contínuo, como se fosse impresso os diversos momentos do movimento, a exemplo podemos observar a obra “Estudo de corrida” (1886), no bloco Fragmentação.
   László Moholy-Nagy se destacou pelo desenvolvimento de inovações técnicas e formais como o fotograma, posicionando objetos entre uma folha de papel fotosensível e uma fonte luminosa, de maneira que suas sombras e transparências fossem projetadas e registradas no papel, conforme a duração e intensidade da luz, assim temos o fotograma sem título (1923), no bloco Abstração.
   Outra técnica é a fotografia aérea, onde o fotógrafo em um avião ou balão, fazia um giro de 90º em relação ao registro frontal e captava uma imagem de cima. Dessa maneira, o resultado era um formato achatado, composto de linhas e contornos. Em relação às fotografias áreas, um crítico da época comentou que: “o romantismo dos bosques se mescla com a matemática”, registrando assim, as diversas possibilidades de registro diferenciado que as angulações podem gerar. Neste contexto, temos a obra “Trigal” (1926), do fotografo Robert Petschow, no bloco Geometria.
   Utilizando o efeito de solarização é possível recortar e distorcer detalhes de uma imagem que seria a representação do real. Um exemplo de obra que utiliza esse recurso é “O Combate de Pentesiléia” (1937), de Raoul Ubac no bloco Profusão. A obra representa o combate mitológico da Guerra de Tróia e a paixão paradoxal entre a guerreira Pentesiléia e seu inimigo Aquiles. Para essa construção conceitual, o artista produziu uma grande confusão visual, pois, partindo da idéia que a mitologia é uma leitura irreal da realidade, a obra busca, a partir da fotografia, gerar uma imagem que não seja uma cópia fiel do que é real.
   Outra maneira de gerar estranhamento é distorcendo o real, como é possível ver no trabalho de André Kertész no bloco Distorção, com a obra intitulada “Distorção nº 40” (1933). Ao passear em um parque de diversões, o artista entrou numa sala de espelhos e constatou as imagens distorcidas que os espelhos refletiam. Com essa inspiração, o artista produziu uma série de fotografias de nu feminino em reflexos com espelhos ondulados.
   O registro do real às vezes não é o bastante para controlar a mente criativa de alguns artistas. A necessidade de explorar as técnicas e desenvolver uma maneira muito particular de produzir sua própria expressão do mundo faz com que os resultados fujam daquilo que é esperado, tornando-se único e até mesmo causando estranhamento.

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